O que é isso? Helicópteros e sirenes não detêm crime

Os arrastões tradicionais cariocas aconteciam na praia, com todo mundo descalço

A polícia carioca já ocupou e “pacificou” um número impressionante de 13 favelas desde o fim de 2008. Também já começou a atentar para as milícias que extorquem moradores de bairros pobres onde traficantes de drogas estão ausentes. E o Estado do Rio está rapidamente aumentando sua presença nas favelas pacificadas, com o programa inovador da UPP social.

No final da semana passada, a polícia militar também conseguiu dar fim a uma batalha que durou dez dias entre gangues rivais de traficantes de drogas, em Madureira.

Mas continua sem trégua a onda de arrastões que acontece em vários locais da cidade desde o início de setembro.  Por enquanto ninguém diz quem está fazendo os arrastões, nem se os criminosos seriam traficantes ou milicianos recém-despejados de seus territórios. Se os crimes continuarem por mais muito tempo, periga erodir o apoio das classes média e alta pela política estadual de segurança pública, tão evidente na reeleição de margem ampla de Sérgio Cabral para governador no dia 3 de outubro.

O problema pode residir em semântica. Gustavo de Almeida, assessor de imprensa do comandante-geral da Polícia Militar, acredita que a palavra “arrastão” esteja sendo usada demais, para descrever praticamente qualquer assalto nas ruas asfaltadas da cidade. A tal onda, diz ele, pode ser apenas uma coleção de crimes que fazem parte da vida normal urbana. Não há como saber as origens dos criminosos e nem fariam parte de qualquer movimento organizado para desestabilizar a política de segurança pública do Estado.

Diz ele, em palavras exclusivas para o RioRealblog:

Eu não diminuo de maneira nenhuma o impacto e o trauma que os assaltos ocorridos causam nas vítimas, e, claro, nos cidadãos cariocas que tomam conhecimento destes fatos. O que eu questiono, sempre, é a utilização da mesma palavra para ocorrências diferentes. Convencionamos no passado distante chamar “Arrastão” todo aquele assalto que é praticado por muitos agressores e com muitas vítimas. A imprensa atualmente chama de arrastão qualquer assalto “rápido” (como se todos os assaltos não fossem rápidos) e em “via pública”.
Questiono seriamente isto. Não que eu negue a existência de “arrastões” no Rio de Janeiro. Por exemplo, houve outro dia um assalto a ônibus em que 45 passageiros foram vitimados, na Avenida Brasil. Ora, com tantas vítimas, isto não é um “arrastão”? Por que é apenas um “assalto a onibus”? Há uma tabela para quantificar o “arrastão”?
O uso desta palavra serve, portanto, para tipificar como grave crimes que são comuns (embora indesejáveis, claro) numa cidade grande como o Rio de Janeiro. Dão aos crimes uma gravidade muito maior do que a que eles já têm – e acabam contribuindo para prejudicar a imagem de uma cidade que hoje tem uma política de segurança pública bem definida, uma Polícia Militar que não para de tentar melhorar, de rever métodos e procedimentos.
Há um mês, fomos consultados sobre “arrastões” na Avenida Martin Luther King, antiga Avenida Automóvel Clube, na Zona Norte. Pedimos uma reunião com o comandante do Comando de Policiamento da Capital, coronel Marcus Jardim. Ele fez uma pesquisa de registro de ocorrência e, naquele mesmo dia, detectou que em duas semanas, nos 25 quilômetros de via, haviam sido registrados seis roubos de automóveis (em ocorrências separadas) e dois de motocicletas.
É claro que são roubos que não podemos minorar e que não deveriam acontecer. Mas infelizmente o modelo de metrópole que hoje temos no mundo ocidental leva a este “ideal” de “mais baixo índice possível”, mas reconhecendo o zero como impossível.

O noticiário da TV Globo tem como política usar pouco a palavra “arrastão”, porém a mídia impressa do mesmo grupo já  difere. Uma busca pela palavra no blog “Caso de Polícia” do jornal Extra (do Globo) levantou quase vinte casos de vitimas na rede pesqueira nos últimos dois meses. Duas pessoas morreram baleadas nesses ataques, inclusive uma criança; mais duas se feriram. A polícia militar efetuou mudanças de pessoal e voltou a utilizar patrulhas de helicóptero no intuito de criar uma estratégia anti-crime mais bem-sucedida, mas até agora continuam os tais arrastões. Segunda-feira à noite no Humaitá, perto da Casa de Espanha, três homens armados bloquearam o trajeto de carros e levaram os pertences de três motoristas, e mais as chaves de dois dos carros. A polícia demorou 15 minutos para chegar; mais tarde fizeram um apelo para que motoristas abram a passagem ao ouvir sirenes.

Mas os cariocas sabem que isso pode ser perigoso. Apenas dez dias atrás, um motorista perdeu seu Fiat Uno para um “policial” que dirigia uma moto com a sirene ligada. Foi somente ao descer do carro, a mando do soldado, que reparou nos tênis do homem uniformizado, no lugar da bota preta comum ao figurino padrão da PM.

About Rio real

American journalist, writer, editor who's lived in Rio de Janeiro for 20 years.
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