Quarta de uma série de pepitas conversacionais, sobre a transformação da vida cultural na cidade maravilhosa.
For Visual arts: Rio yawns and stretches, click here
“Durante muito tempo, eu pensei morar em São Paulo,” diz a curadora, crítica de arte, jornalista e blogueira Daniela Name. “O Rio perdeu importância, o carioca permitiu que a gente virasse mais uma cidade no circuito. Os artistas jovens iam para São Paulo.”
Agora, ela acrescenta, “A gente se organiza.”
Recentemente, Name organizou a exposição Jogos de Guerra no Caixa Cultural, em cartaz até 28 de agosto. Muitas peças não são assinadas por cariocas, e antedatam a atual integração da cidade, iniciada no final de 2008. Contudo, grande parte do conflito ao qual fazem referência surge da perturbadora desigualdade que não sumiu.
Diz o texto da curadora: Os efeitos de nosso despreparo individual e coletivo para lidar como este território novo – outra pessoa, outra língua, outro credo e mesmo outro time de futebol – são o tema desta mostra. Somos inábeis com a mesa de negociações e a arte tem sido uma boa estratégia para evidenciar, analisar e, com sorte, minimizar nosso baixo rendimento.
Jogos de Guerra leva quem conhece a exposição a refletir sobre como os artistas no Rio de Janeiro percebem o ambiente em transformação, e se ela influencia suas obras. Mas provavelmente seja cedo demais para dizer se a integração urbana está energizando a arte em terras cariocas.
Há muito tempo, o Rio já atrai e inspira os artistas. Em 2003, criou-se um grupo chamado Imaginário Periférico, com o objetivo de “amplia[r] para a periferia o cenário da produção artística, atualmente centralizada e monopolizada por curadores, instituições e marchands.”
Sempre houve artistas que moram e trabalham na periferia, tais como Jarbas Lopes, ativo desde os anos 1990.
Até agora, a única novidade é que o Rio de Janeiro enfim tem dinheiro para criar, promover e investir nas artes.
No dia 11 de agosto, a secretaria estadual de cultura anunciou que irá gastar um total recorde de R$ 40 milhões neste ano e 2012, em iniciativas que vão desde filmes de orçamento baixo, ao restauro arquitectônico e música funk.
E no começo de setembro, a primeira ArtRio, uma feira de arte, será instalada no Cais do Porto, numa área em plena revitalização. Com duração de quatro dias, a feira já atraiu em torno de 80 galerias brasileiras e estrangeiras, da América Latina, Europa, e Nova York. Pelo menos um artista carioca, o Smael, viaja diretamente da ArtRio para expor suas obras em Paris. [Uma reportagem do jornal O Globo do dia 9 de setembro relata o enorme sucesso da feira, com estandes inteiros sendo esvaziados (e supridos novamente) por causa das compras de visitantes. Uma visita do RioRealblog constatou que a exposição, sobretudo das obras nacionais, é mais impressionante do que muitas exposições de museu].
Em geral, falta muito para que a nova Rio de Janeiro consiga inspirar e atrair o mundo das artes de maneira marcante. “Precisa de estrutura,” ressalta Name. Diz ela que a renovação do antigo Cinema Imperator, localizado no Meier (Zona Norte), é um bom modelo. Transformado em centro cultural, irá oferecer três cinemas, um teatro grande, uma área para exposições, livraria, restaurante, café/bistro e um jardim– tudo com o auxílio dos governos estadual e municipal. O perigo aqui, é claro, é uma volta à decadência, quando os políticos atuais não estejam mais nos cargos de hoje.
Por enquanto, tais empreendimentos podem ter um efeito multiplicador nas crescentes energias culturais do Rio de Janeiro, e nos forçar a sair de nossas zonas de conforto. “A gente experimenta a cidade por imagem,” considera Name. “Isolados em Ipanema, podemos ver a Etiopia.” Ao passo que o Rio de Janeiro se une, diz ela, podemos ver, ouvir e sentir muito mais, sobretudo em um lugar com tanta história. “Existem mil cidades sobrepostas ali!”