Tipo carnaval, com menos lixo
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E com menos música, mais trânsito, e o que aparentava ser toda a Marinha brasileira navegando do norte ao sul e do sul ao norte, pela costa. Também, não se tratava de fantasias, a não ser que se contabilize pessoas como o índigena brasileiro que mirou um segurança do BNDES com arco e flecha…
Na verdade, o único atributo que a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável teve em comum com o carnaval foi a invasão de visitantes, que totalizaram 110 mil pessoas. Na zona sul, por todos os lados havia gente de crachá pendurado pelo pescoço.
Os engarrafamentos aconteciam não por causa de blocos nas ruas, de foliões sambando e bebendo, mas por causa de manifestações, e hordas de veículos insustentáveis ocupando as pistas. Escoltadas por policiais de motocicleta com sirenes ligados e barulhentos helicópteros, os comitivas de 190 países iam e voltavam do Riocentro na zona oeste em oposição exata às horas e sentidos das horas de rush cariocas. Para abrir caminho, a prefeitura suspendeu as reversões normais de manhã, cancelou as aulas por três dias, fechou repartições públicas e aconselhou aos cidadaos que era melhor ficar em casa ou utilizar o transporte público.
Muitos visitantes criticaram a falta de organização e o serviço ruim que experimentaram. Milhares acamparam no Sambódromo e na Quinta da Boa Vista, por falta de acomodação na rede hoteleira. Uma delegação japonesa a caminho da Estação Alegria de tratamento de esgoto errou o caminho e se deu de cara com homens armados numa favela do Caju.
Maurie Carr, coordenadora de projetos para a fundação Global Environment and Technology, uma entidade sem fins lucrativos de Washington D.C., ficou uma semana numa casa de retiro na serra, próxima a Duque de Caxias. Alguns dias, ela levou três horas até o Riocentro. “Foi uma aula de desapego,” ela falou, acrescentando que apesar de tudo pretende voltar ao Rio. “Falei para minha mãe colocar o Rio na lista,” ela disse. Conseguiu um tempinho para conhecer algumas trilhas na serra, e mais o Leblon, Ipanema, Rocinha eVidigal.
Também, a conferência deixou claro quanto ainda falta para que o Rio de Janeiro possa se considerar uma cidade sustentável. Uma porção minúscula de lixo é reciclado, e a baía de Guanabara, por exemplo, está horrendamente poluída apesar de ter sido suposto alvo de uma limpeza custando milhões de dólares. Pelo menos todo dia o Grupo EBX de Eike Batista está tirando 250 quilos de lixo, da Lagoa Rodrigo de Freitas.
No fim das contas, grande parte do Rio + 20 não foi um bom indício do que se pode esperar na visita do papa no ano que vem, na ocasião da Copa do Mundo de 2014, e nem para as Olimpíadas de 2016. Mas a situação pode mudar quando novas opções de transporte público começarem a funcionar, além do corredor Transoeste para ônibus articulados, que se inaugurou no começo deste mês.
O resultado da conferência em si também decepcionou, como previsto. “Os governos são inúteis,” diz Clayton Ferrara, que viajou da Flórida ao Rio para representar o movimento liderado por jovens IDEAS for Us. “Todo dia na sessão plenária, os representantes dos países subiam ao pódio para falar e falar e falar sobre o que eles estavam fazendo pela sustentabilidade,” diz ele, acrescentando que o público se escasseava ao passo que os dias passavam.
Contudo, para o Rio de Janeiro houve três aspectos positivos da conferência.
Um foram as trocas entre os mundos de negócios, das universidades, do terceiro setor, e até dos chatos dos diplomatas. A Cûpula dos Povos, reuniões extraconferência, seminários, e encontros por acaso juntaram todo tipo de ideias e informação. Muitas universidades americanas marcaram eventos para graduados locais e pesquisadores que chegaram para a conferência, para suscitar novas conexões entre as pessoas. A ONU também coordenou reuniões do setor privado e compromissos de ações de sustentabilidade.
Outro foi o aprendizado sobre a sustentabilidade. Por dias, adultos e alunos fizeram fila para ver a exposição de bela criatividade Humanidade 2012, que aconteceu numa estrutura temporária ao lado do Forte de Copacabana. Por volta de 200 mil pessoas tiveram a chance de passar pelas provocações de artistas e intelectuais sobre estilo de vida e o meio ambiente. As federações de indústria do Rio de Janeiro e de São Paulo pagaram a conta.
E a ONG que acompanha os indicadores do Rio, Rio Como Vamos, fez um levantamento de opinião pública revelando que um surpreendente 74% da população estava informado sobre a conferência e aquilo que pretendia. Os 1.800 respondentes eram de bairros, rendas e idades variados; esse resultado deve ser útil na hora de organizar a reciclagem e mutirões de limpeza de lixo.
Por último mas certamente não de menor importância, são as medidas e metas muito reais que foram anunciadas antes e durante a conferência. São eles:
- A criação da Bolsa Verde Rio, para transações de crédito e carbono e outros mecanismos de compensação ambiental, para atender às empresas que precisam cumprir as leis visando sustentabilidade
- Como resultado de uma manifestação perto do Riocentro, o agendamento de uma reunião de representantes da Vila Autódromo, cujos moradores não querem ser removidos devido aos preparativos para as Olimpíadas, com a ONU e o governo brasileiro
- A Declaração do Rio de Janeiro 2012, um pacto entre governadores brasileiros e de outros países para reduzir o consumo de energia em prédios públicos e a emissão de gases do setor de transportes por 20% até 2020, além de outras medidas
- Uma decision pela Cúpula C40 de Grandes Cidades para reduzir emissões de carbono em 58 cidades e para compartilhar informações sobre sustentabilidade. Essas cidades, que abrigam 320 milhões e são fonte de 21% de GDP mundial, são responsáveis por 12% das emissões do mundo. O Rio pretende reduzir emissões por 12% até 2016. Mesmo assim, elas devem aumentar— mas menos do que seria o caso sem esse compromisso.
- Uma proposta pela FIRJAN, a federação industrial do Rio, para privatizar o saneamento
- A criação de um centro de pesqisa de sustentabilidade, o Centro Rio +
- Um empréstimo do Banco do Brasil para a limpeza das lagoas da Barra da Tijuca
- Uma proposta da prefeitura a ser votada pelos vereadores da cidade, criando incentivos fiscais para métodos de construção e design verde
Vinte anos após a Eco 92, mudou tanta coisa. Uma recordação que perdura para essa blogueira daquela conferência da ONU é da fila de gente animada para experimentar o novo cartão de telefone, uma ação pioneira da Telerj para substituir as fichas telefônicas. A União Soviética acabara de ruir e o Muro de Berlim era recém demolido. Os indígenas brasileiros apareceram de relâmpago para nos lembrar de seus papeis no meio ambiente, do mesmo jeito que fizeram na semana passada.
Se o planeta continuar a existir, quem sabe como será o Rio de Janeiro daqui a vinte anos? Muito irá depender dos jovens como os dessa foto, fazendo brincadeiras na exposição Humanidade 2012.