Um prefeito não tão novo assim

Um homem híbrido para tempos híbridos: Eduardo Paes ganha fácil a reeleição em primeiro turno, com um recorde de 64.6% dos votos

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Bem à vontade

Ele ajudou a trazer os Jogos Olímpicos para o Rio, instalou tecnologia de última geração para operações municipais de rotina, abriu novos espaços de lazer fora da Zona Sul, deu à Zona Oeste uma pista exclusiva de ônibus com ônibus articulados, diz estar tirando as escolas municipais de décadas de decadência e expandiu o sistema de saúde preventiva. Ele fala inglês fluentemente (e diz fuck com a mesma frequência que fala porra, em português) e sabe como encantar investidores estrangeiros e parceiros.

No domingo, Paes disse que planeja focar em saúde e transporte na segunda gestão. A maior parte dos feitos de seu primeiro mandato foi direcionada à parte da pirâmide social ocupada pela nova classe média e mais abaixo, cujas necessidades e demandas finalmente se tornaram prioritárias na última década. As classes altas admiram sua capacidade administrativa; a maioria de seus secretários são pessoas energéticas, de cabeça aberta.

Ideias sim, máquinas políticas, não

Ainda assim, Paes precisou de uma máquina política– o que seu principal opositor, Marcelo Freixo, que obteve 28% dos votos, não tinha e dizia desprezar. Paes fez uma aliança com mais 19 partidos, que o levou a manter uma maioria esmagadora na Câmara Municipal, com 39 dos 51 vereadores ao seu lado. Anteriormente, ele tinha o apoio de 38 vereadores.

As coligações, como o ex-presidente Luis Inácio “Lula” da Silva e sua sucessora Dilma Rousseff bem sabem, são necessárias principalmente em uma sociedade onde há muito tempo grande parte da população ficou à margem da participação política e econômica formal. Os menos favorecidos dependem de vínculos pessoais a chefões territoriais ou empresariais, que em troca de votos ajudam na resolução de problemas .

A única difficuldade com as coligações, como nas últimas semanas Lula e seus antigos capitães estão descobrindo, com o julgamento do Mensalão em Brasília, é que essas máquinas precisam ser alimentadas –- e tornou-se cada vez mais difícil fazer isso de maneira discreta, ao passo que os brasileiros acordam e exigem mais respeito por parte de seus políticos.

Um governo militar assumiu o poder aqui em 1964 porque as classes mais altas temiam justamente esse despertar do povo. Durante vinte anos, o país elegeu diretamente apenas uma minoria de congressistas. A primeira eleição democrática aconteceu em 1982, para governador; a primeira para eleição presidencial direta foi em 1989.

Sob as asas do ex-prefeito César Maia, que governou por três mandatos e agora se elegeu  à Câmara Municipal, Paes aprendeu a difícil arte de mediar entre os chefões e a população. É uma arte necessária nesses tempos, em que o Brasil transita do velho clientelismo para a democracia moderna, onde questões e ideologias, em vez de personalidades, estão no centro das eleições.

Político de longa data e ex- chefe de segurança pública do estado não foi eleito vereador

Para Freixo e seus partidários (bem como para muitos outros candidatos), o modus operandi e as prioridades de Paes contrariam a visão do Rio de Janeiro que eles têm. Eles dizem que Paes favorece empreendedores imobiliários, empresas de construção e donos de frotas de ônibus, assim como chefes de milícia, e que o resultado disso será a expulsão dos pobres do centro e da Zona Sul, em direção à Zona Oeste. Eles reclamam de seu estilo autoritário e da falta de participação comunitária e da Câmara de Vereadores no que tange à revitalização da cidade. Acrescentam que muito do que ele fez é superficial, apontando sobretudo as escolas públicas e o transporte público.

Paes tem o apoio do império Globo, que publica poucas matérias investigativas sobre o desenvolvimento urbano ou o transporte, e fez vista grossa às alegadas ligações do prefeito com as milícias apesar de as milícias serem a razão da presença de 3.500 tropas armadas ocupando muitas das favelas não pacificadas da cidade durante as eleições (Após denúncia da revista Veja, O Globo  noticiou um pedido do procurador regional eleitoral para investigar uma suspeita de pagamento de propina por Paes, ao pequeno PTN, em troca de apoio).

Muitos cariocas dizem não se importar com quem é o prefeito; estão acostumados a levar e ganhar a vida a despeito da política. Isso explica porque as eleições apresentaram uma taxa significativa de abstenção – 20,45%- apesar de o voto ser obrigatório no Brasil.

Dois milhões votaram em Paes, mas um milhão votou em outros candidatos

Com uma vitória esmagadora no primeiro turno de reeleição, uma maioria incontestável na Câmara Municipal e a inexistência de uma imprensa crítica de massa – além das alianças com o governador do estado e com a presidente Dilma – Paes parece exercer influência monolítica no Rio.

Porém, o fato de que o Rio e o país como um todo estão em transição significa que o terreno sob os pés do prefeito não está nada estável. À medida que a base da pirâmide socioeconômica se expande e os cariocas passam a ter mais acesso à informação e à autoexpressão através da tecnologia, Paes precisará refinar constantemente a arte da mediação; isto é, alimentar a máquina, enquanto atende ao eleitorado. Será interessante assistir a isso.

“Nada deve parecer impossível de mudar”: bordão de Freixo

Segundo Leonardo Eloi, diretor de projetos da ONG de ativismo politico digital, Meu Rio, “Esse pleito foi muito interessante pelo simples fato do surgimento de um novo movimento político de oposição capitaneado por jovens apaixonados, observando-o emergir na cidade durante essas eleições, como há muito não se via. É fato que esse movimento despertou a consciência sobre a importância da participação da sociedade na política local em que pessoas que costumavam ficar alheias ao processo e suscitou o desejo em milhares de jovens de estarem mais próximos da administração da cidade, o que certamente se refletirá positivamente no próximo governo.”

Tradução de Rane Souza

About Rio real

American journalist, writer, editor who's lived in Rio de Janeiro for 20 years.
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