Uma exceção à regra em primeira mão
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Em 1981, quando eu cheguei ao Brasil, uma música da parada de sucessos americana demorava seis meses para aparecer nas rádios daqui. Quando eu cheguei aqui, pessoas pobres acima de 30 anos usavam dentaduras. Atualmente, eles usam aparelhos ortodônticos.
No ano passado, eu tentei explicar para Alessandra Orofino, de 24 anos, co-fundadora do bem sucedido site de ativismo digital, Meu Rio, o quanto o país já mudou.
“Eu não me importo com isso,” ela disse. “Eu não estava aqui para ver isso. Estou aqui agora e quero mudanças agora.”
Quem são esses jovens?
Quem são os manifestantes, pessoas que finalmente tomaram as ruas em todo o país? Há imensa variedade. Nesta semana na televisão, vi professores de Juazeiro do Norte, cujos salários sofreram corte de 40%, que cercaram o prefeito da cidade, ao flagrá-lo fazendo um depósito (!) numa agência bancária. Horas depois, o prefeito conseguiu sair, escoltado por policiais. Considerando o que eu vi na TV, li no Facebook e vi com meus próprios olhos nas ruas do Rio, os manifestantes em sua maioria são estudantes do sexo masculino, de vinte e poucos anos. Eles não são trabalhadores. Então, por que eles estão protestando?
Aposto que os prefeitos do Rio e de São Paulo amaldiçoaram o dia em que, em janeiro deste ano, acataram o pedido de Dilma para adiar o aumento nas passagens de ônibus por seis meses para ajudá-la a manter a inflação baixa. Se o aumento nas tarifas de ônibus tivesse acontecido em janeiro, os estudantes estariam em férias…
Como disse no meu último post, o aumento na tarifa de ônibus é um lembrete doloroso das duas camadas que compõem a estrutura socioeconômica brasileira, onde o rico e o pobre têm seus próprios planos de saúde, escolas, transporte e soluções para segurança pública. Muitos dos manifestantes talvez não façam uso do SUS e talvez tenham frequentado colégios particulares. Mas, eles andam de ônibus. E, apesar de eles não enfrentarem o longo deslocamento que uma empregada doméstica, um garçom ou um atendente de posto de gasolina enfrentam, eles também sofrem a opressão de um sistema que oferece serviços mal administrados e inadequados cujos custos reais são desconhecidos pelos passageiros.
O aumento das tarifas de ônibus fez lembrar que isso acontece em todos os aspectos da vida aqui. E, enquanto trabalhadores, principalmente aqueles que enfrentam longos deslocamentos, não têm tempo para marchar nas ruas: os estudantes têm sim.
Não estou dizendo que eles são um bando de altruístas, marchando pelos trabalhadores.
Eles simplesmente sentem a desigualdade na própria pele – e, eles sabem conscientemente ou não, que um país com um sistema como esse não vai longe. Isso traz um impacto para o futuro deles. Na atualidade, todos sofremos com o pouco preparo de tantos trabalhadores, o que, por exemplo, atrasa a capacidade do país de explorar as reservas petrolíferas.
Por que os estudantes que andam de ônibus não se pronunciaram antes? O Brasil se tornou um país de classe média. Quando era um país dos que muito têm e dos que pouco têm, de que adiantava reclamar das injustiças? Agora, quando os brasileiros se sentem menos desiguais do que nunca, a lógica do sistema parece mais distorcida do que nunca. Ninguém investe em mudança sem que ela pareça factível.
O que vai sair disso tudo?
O governo da presidente Dilma, e de todos os que a precederam, provavelmente, desde os tempos coloniais, tem por base uma sociedade em que são desconhecidos os custos reais de serviços públicos mal administrados e inadequados (assim como os arranjos por trás deles). Até agora, ela disse que as reivindicações dos manifestantes são legítimas e que merecem ser ouvidas – é a coisa certa a se dizer.
Mas… como ela irá reformar, com a rapidez esperada por Alessandra Orofino, as escolas, os hospitais, a polícia, os ônibus, os trens, as estradas e os sistemas de metrô do país? Isso sem falar dos aeroportos.
O governo dela está alicerçado em alianças políticas instáveis com muita troca de favores. Além disso, imagino que ela e muitos outros políticos em várias esferas do governo tentarão dar uma esmola para os manifestantes. Muitos prefeitos já baixaram as tarifas de ônibus.
Não é só por vinte centavos
O mundo guarda muitas surpresas para nós: em 1989, quem imaginava que fosse possível derrubar o Muro de Berlim? Quem poderia imaginar que milhares de brasileiros acordariam para lamentar as desigualdades e injustiças do próprio país? Nos mais de 30 anos em que tenho morado aqui, até a semana passada, eu achava que as mudanças aconteceriam aos poucos. Porém, atualmente você pode baixar uma música instantaneamente e você pode iniciar um movimento sem depender de populismo – de modo colaborativo. A figura do líder já não é tão crucial.
Então, talvez, exista a possibilidade de que o diálogo que surge dessa inquietação nos leve a algum lugar um pouco mais rápido do que eu esperava. #MUDABRASIL
Tradução de Rane Souza
There are many dots to connect, and you have documented them very well. No question the protests are more than just about transportation fees. Maybe the young are more concerned about the lack of inclusion into a process that makes no sense. This new generation sees through the old tired narrative of the church, politics and business and demand a better explanation. Young Americans face similar distresses, but for some reason do not take to the streets, not even to protect their own decaying democracy and middle class. Hopefully these young Brazilians will light a fire that will spread around the world.