
Do lado de fora do teatro, depois do show: dançarinos de passinho brincam no Retângulo Vazado, de 1996, executado pelo escultor Franz Weissman — diante do Real Gabiente Português de Leitura, aberto em 1887, apenas um ano antes da abolição no Brasil
Rodeados, do jeito que estamos, por tantos jogos da Copa, é de espantar se alguém tem tempo para fazer qualquer coisa além de gritar, choramingar e vaiar. Mas o Rio não para, sobretudo desde 2008, quando a cidade começou a integrar as partes informais e formais, melhorando a acessibilidade. Assim que, no sábado à noite, esta blogueira corria pelo centro da cidade, tentando dar conta de tudo.
Muito infelizmente, foi preterido o fabuloso Baile Charme na Pedra do Sal. Fala-se que recebe pessoas de diferentes raças e nacionalidades de forma hospitaleira e confortável, com ótima música, no local histórico onde escravos descarregavam sacas de sal.
A primeira parada foi o Paço Imperial, na Praça XV, a versão carioca do Faneuil Hall de Boston (referência magistral por ser a cidade natal da blogueira), localizado, como em Boston, de frente a um espaço que já abrigou um mercado, beirando uma baía (e os dois, anteriormente, separados por uma perimetral!) . O local é o primeiro de seis pontos no centro, escolhidos neste mês para uma série de espetáculos, encenados com uma boa dose de licença poética, mostrando momentos chave da história brasileira.
O Paço Imperial é o único dos seis pontos que fica ao lado sul da avenida Presidente Vargas, que em 1944 dividiu a cidade. A parte ao norte é a área do porto, que decaiu a partir dos anos 1980, com o advento dos conteineres — e hoje está sendo revitalizada, com o programa municipal Porto Maravilha. Notavelmente, vários dos pontos na área do porto têm alguma conexão com a história dos cidadãos brasileiros de origem africana.
Um dos locais, o Cais do Valongo, onde desembarcavam escravos, surgiu durante as obras dos últimos anos, lembrando brasileiros de uma história dolorosa, minimizada durante séculos. Será interessante ver como o performance de música, dança e teatro, ali marcado para hoje às 17 horas, irá fazer nexo com essa história. A obra de sábado à noite — pelo menos o começo, pois aconteceu que, na correria, esta blogueira perdeu uma parte — aparentava continuar com uma certa minimização, pois escravos sorridentes entravam em cena carregando castiçais, gaiolas e um reluzente abacaxi, enquanto a corte portuguesa assistia do alto.
A deconstrução da história certamente ocupa um lugar importante no panteon das artes, mas surge, neste caso, uma dúvida: numa cidade em pleno redescobrimento de si mesma, não seria mais adequada uma simples reencenação histórica?
Na praça Tiradentes, um grupo de jovens dançarinos, a maioria negra, a maioria morador de favela, apresentavam, animadíssimos, o primeiro musical do passinho, Na Batalha, que estará no palco do Teatro João Caetano toda sexta-feira, sábado e domingo nas próximas semanas, até o dia 12 de julho.
Escrito por Julio Ludemir e DJ Sany Pitbull, dirigido por Raul Fernando, coreografado por Lavinia Bizotto e Rodrigo Vieira, com impressionante arte visual de João Penoni, trata-se de um espetáculo imperdível. Com grande força e energia, homenageia heróis negros e conta as rivalidades de grupos, a realidade do crack, a violência policial, o trabalho, a moradia e muito mais que hoje faz parte da vida no Rio de Janeiro.
O passinho se destaca de outras correntes de dança de rua pela conexão íntima que tem com a mídia social, sobretudo a YouTube.
E, se você não estiver no Rio, corra a Nova York para ver o passinho. Após a apresentação do fabuloso documentário de Emílio Domingues sobre o passinho, no dia 22 de julho às 18h30, os rapazes estarão no festival Out of Doors do Lincoln Center, às 20 hs.
Agora veja um vídeo amador e exclusivo do grupo, na brincadeira após o show de sábado:
love the video!