A força metropolitana: uma solução, enfim, aos problemas compartilhados?

Chegou a hora, mesmo com atraso, da metrôpole.

Quando sua blogueira começou esse trabalho, há quase cinco anos, não pensava que estivesse fazendo reportagens e escrevendo sobre a região metropolitana do Rio de Janeiro. Pensava apenas na cidade do Rio de Janeiro.

E não é que, nas últimas semanas, houve eventos imperdíveis em Magé e Duque de Caxias?

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VLT não é só para o Porto Maravilha. Em Magé, falou-se de planos para VLT em Macaé

Em Magé, houve no fim de abril um congresso sobre mobilidade e emprego, focado sobretudo no recuperação dos trens metropolitanos (além do que já vem sendo feito pela SuperVia) e a implantação de VLTs. As linhas de trem, que datam de 1854, foram um fator central no desenvolvimento das cidades vizinhas ao Rio e nas relações delas com a capital. De fato, a primeira linha férrea passou por Magé: a família imperial saía do Rio de barco a vapor e embarcava de trem em Magé, para viajar até Petrópolis.

Hoje, enquanto a capital abriga apenas seis milhoes de habitantes, a região metropolitana do Rio de Janeiro é composta de uma população de quase 13 milhões, espalhadas em 21 cidades cobrindo mais de sete mil quilômetros quadrados. Compartilhamos questões difíceis como saneamento, mobilidade, emprego e saúde.

Desses 13 milhões de habitantes, um terço mora em áreas informais, ou seja, favelas e loteamentos.

No dia 5 de maio, a cidade de Duque de Caxias hospedou o primeiro de uma série de seminários sobre assuntos metropolitanos, organizados pelo thinktank IETS e pela nova Câmara Metropolitana de Integração Governamental , uma entidade que começou a tomar vulto em agosto passado, em função de uma decisão do Supremo Tribunal que requer a institucionalização do pensamento metropolitano no Brasil.

O prefeito de Duque de Caxias, Alexandre Cardoso

Com a palavra, o prefeito de Duque de Caxias, Alexandre Cardoso, presença marcante

Os seminários são uma espécie de pré aquecimento, para quem formula ou executa políticas públicas voltadas para a metrôpole. Logo que a Assembleia Legislativa do estado aprovar o arcabouço legal da Câmara, os 21 prefeitos, junto com o governador Pezão, irão começar a destrinchar as complexidades que levaram, por exemplo a nossa incapacidade — até agora, pelo menos — de manter a promessa olímpica de limpar a baía de Guanabara.

O do dia 5 teve um ar de desabafo, com direito a fatos e informações beirando o escandaloso. Alexandre Cardoso, prefeito de Caxias, pretende acabar com as enchentes crônicas que assolam sua cidade. Mostrou um impressionante filme do Rio Meriti, que está sem dragagem há trinta anos. O assoreamento fez com que o nivel do rio fique mais alto, em alguns pontos, do que a própria cidade. Assim, quando chove forte as águas voltam para Caxias.

A cidade tem pouquíssimos fiscais, ele acrescentou, e enfrenta dificuldades para cobrar impostos. Nunca foi consultada sobre projetos de mobilidade, como a Rodovia Washington Luís, a Linha Vermelha ou o BRT Transcarioca, apesar do fato que 110 mil pessoas saem diariamente de Caxias para trabalhar no Rio de Janeiro.

“Havia estações de tratamento em Caxias, abandonadas,” disse Luiz Edmundo Costa  Leite, há dois anos secretário  de  Habitação, Planejamento e Urbanismo de Caxias. “Nunca se fez planejamento de bacia ou de região.” As poucas redes de esgoto existentes não eram mapeadas, acrescentou.

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Sérgio Besserman: quando o sistema imunológico da criança luta contra a infecção (que provém da falta de saneamento), pode sofrer atrasos ou danos cognitivos. Isso afeta gerações

Cedae, a companhia estadual de água e esgoto, pretende gastar R$ 4,3 bilhões em obras na Baixada, disse Jorge Briard, o novo presidente. Mas o problema nunca foi apenas de falta de recursos. Briard, cuja carreira toda tem sido na Cedae, lamentou que as pessoas joguem lixo nos rios porque a coleta de lixo nos bairros não é satisfatório. “O lixo é municipal, o saneamento é estadual. Quem é responsável?”

Ao ouvir as histórias de tantos desencontros, através de décadas, essa blogueira lembrou de um relato triste sobre o dia a dia do Comitê Organizador Rio 2016. De acordo com uma fonte que não quis se identificar, é grave a falta de coordenação entre as entidades que devem limpar a baía a tempo para os Jogos. O Comitê tomou para si o trabalho, então, de comunicar a cada uma delas uma lista de cada tarefa a ser empreendida, com cronogramas exatas e followup constante.

Apesar de termos gasto milhões na suposta despoluição da baía, desde o começo dos anos 1990, hoje, os participantes do seminário disseram, precisamos de uns R$ 14 bilhões para atender às necessidades de saneamento em toda a região metropolitana. Não temos esses recursos, admitiu André Corrêa, o secretário estadual de Meio Ambiente que, dois dias antes, havia se banhado nas águas da baía, ao estilo dos políticos de antigamente, para provar que as provas aquáticas dos Jogos podem sim acontecer ali. A solução seria um forte envolvimento do setor privado.

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O drama de Caxias: não existe filtragem do esgoto

Sérgio Besserman, economista e presidente da Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável da prefeitura do Rio de Janeiro, lembrou que milhões de pessoas pelo mundo sabem o nome de um bairro da capital: Copacabana. Isso não é usual, acrescentou, na maioria dos países. Por esse e outros motivos fortes, disse ele, temos a responsabilidade de zelar pela metrôpole e a baía no meio dela, além das três ûnicas florestas urbanas, a maior sendo a de Pedra Branca (que vem sendo ameaçada pela expansão mobiliária na Zona Oeste da cidade), seguida pela Tijuca e a Mendanha, que separa o Rio de Nova Iguaçu, outra cidade vizinha.

Besserman sugeriu, enfaticamente, a criação de uma “Authority” para “responder pela água da baía”, como têm feito várias cidades do mundo, ao se organizar para combater a poluição.

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Jorge Briard, novo presidente da Cedae, diz que a companhia estuda associações com o setor privado, diferente das PPPs que outros apoiam

O leitor que queira acreditar que a criação da Câmara represente uma virada de página no tocante à limpeza da baía e a vários outros problemas compartilhados pelos 13 milhões dos habitantes da área metropolitana, não deve ler as matérias no acervo do jornal O Globo dos anos 1990. Pois os planos da época estavam igualmente imbuídos de esperança. Falam até na construção de redes de esgoto que iriam ser conectadas às hoje abandonadas estações de tratamento de esgoto.

Talvez hoje seja um momento diferente, porém. Pode ser que a própria crise do petróleo (além da ordem jurídica que levou à criação da Câmara) no estado do Rio de Janeiro funcione para nos revelar, finalmente, uma realidade bem inconveniente — uma realidade que não nos deixará continuar na cegueira e narcissismo de sempre, forçando o amadurecimento político que tanto nos faz falta.

Para mais informações sobre o primeiro seminário, sobre saneamento, há essa reportagem no novo site, VozeRio, e essa, no site de notícias da Casa Fluminense, que pensa ideias para a metrópole e está aberta à participação de todos. Para acessar as excelentes apresentações em Caxias (menos a do prefeito), clique aqui.

Os seminários continuam, abertos a todos (ingresso mediante inscrição pelo e-mail seminario.riometropolitano@iets.org.br ).

Amanhã, dia 13 de maio, tem mobilidade em Nova Iguaçu, com o secretário de Estado de Transportes, Carlos Roberto Osório; o secretário municipal de Transportes do Rio de Janeiro, Rafael Picciani; o diretor regional da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP-RJ), William Alberto de Aquino Pereira; a diretora executiva do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), Clarisse Linke; o vice-presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), José Armênio de Brito Cruz; e o coordenador de Informação da Casa Fluminense, Vitor Dias Mihessen. Acontece das  9h às 13h na Firjan Representação Regional Baixada Fluminense Área I – Unidade Senai de Nova Iguaçu, Rua Gerson Chernicharo, s/nº, Bairro da Luz, Nova Iguaçu.

Dia 20 de maio, o assunto será segurança pública, em Niterói. No dia 28 haverá debate sobre a saúde, em São Gonçalo. O encerramento será no dia 1 de junho, no auditório da Firjan, no Centro do Rio.

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Vicente Loureiro, diretor executivo da nova Câmara Metropolitana — morador de Nova Iguaçu

About Rio real

American journalist, writer, editor who's lived in Rio de Janeiro for 20 years.
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1 Response to A força metropolitana: uma solução, enfim, aos problemas compartilhados?

  1. enojado says:

    Good information. Lucky me I found your blog by accident (stumbleupon).
    I’ve saved as a favorite for later!

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