Corrupção no Rio

Estado é foco de sujeira: como será a limpeza?

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Fachada da assembleia legislativa em 2014: hoje nem todos sorriam

O posto de gasolina onde a Lava Jato começou fica em Brasília, mas pode-se dizer que o maior escândalo de corrupção de todos os tempos começou e, provavelmente, terminará, no Rio de Janeiro.

Hoje, o slogan da candidatura do Rio de Janeiro para sediar as Olimpíadas de 2016 — “Viva sua paixão“– aponta mais a avareza pelo se deposita numa conta na Suiça, do que qualquer outra espécie de fascínio.

É aqui que fica a sede da Petrobras, antro das propinas e do cartel das empreiteiras. É daqui que surgiu o maior vilão da história, o deputado federal Eduardo Cunha, que iniciou sua trajetória política como tesoureiro da campanha presidencial do alagoano Fernando Collor no Rio de Janeiro. Foi convidado por Paulo César Farias, envolvido no escândalo de corrupção que levou ao impeachment de Collor em 1992.

Ficam aqui também as sedes da Furnas, da Eletrobras e a Eletronuclear, todas objeto de investigações relacionadas à cartelização de contratos de construção e a propinas que teriam alimentado campanhas políticas. Foi do financiamento da revitalização da área do porto do Rio de Janeiro, o Porto Maravilha, pelos recursos do FGTS, que surgiu a fatal delação premiada de Fábio Cleto, apontando Eduardo Cunha como suposto gestor. Indicado por Cunha, Cleto administrava os recursos do FGTS, pelo Caixa Econômico (este sim, localizado em Brasília).

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Francos suiços mais procurados do que reais

Aqui também temos o estádio de Maracanã e a faraónica porém abortada refinaria, Comperj, ambos mencionados em delações premiadas, detalhando o pagamento e a lavagem de propinas de construtoras a políticos.

Parte das investigações Lava Jato foi distribuída à Polícia Federal do Rio. Hoje, o colunista do Globo, Lauro Jardim, deu a notícia de que teremos uma nova força-tarefa aqui para investigar o BNDES, outra instituição federal que nunca se mudou para Brasília.

Será que o Rio suscita malvadeza? Ao RioRealblog, o economista Mauro Osório, presidente do Instituto Pereira Passos e especialista sobre o Rio metropolitano, disse que não. Corruptor e corrupto se encontram em qualquer lugar, ele lembra, inclusive em empresas privadas. “Acho que é necessário melhorar as instituições e baratear as eleições”, opinou.

Em uma matéria recente, o correspondente do New York Times, Simon Romero, sugeriu que as raízes da atual crise política nacional podem ser encontradas no modus operandi do PMDB, partido dominante no Rio de Janeiro.

No mínimo, pode-se dizer que o estado é o cerne da maldição do petróleo, que aflige quase todos os lugares onde o combustível se encontra. Além disso, o Rio é, há décadas, uma trabalhosa e pouco republicana manta de retalhos, unida pela incessante troca de favores — não tão diferente do país como um todo.

Difícil saber se esse sistema quase medieval tem algo a ver com a decadência da ex capital, pós 1960. A mudança para Brasília deixou para trás várias instituições federais, que aparentemente, se tornaram cofres para campanhas eleitorais. A estadual Cedae, dizem alguns observadores, passou a desempenhar a mesma função (em vez de investir na coleta e tratamento de esgoto) durante muitos anos, sobretudo sob a influência do Cunha antes de 2008.

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Com royalties do petróleo, Luciano Mota, prefeito de Itaguaí (segundo de direita para a esquerda), região metropolitana do Rio, comprou uma Ferrari

Ele, diga-se de passagem, certamente lapidou suas práticas aqui. Nomeado pelo então presidente Fernando Collor, foi presidente da Telerj, predecessora da empresa de telefonia, Oi, de 1991 a 1993.

Vamos lembrar que São Paulo, nosso eterno rival, também tem suas questões. Os nomes do governador Geraldo Alckmin e do ex governador e hoje chanceler José Serra já apareceram nos documentos da Lava Jato. E há casos anteriores de corrupção, como o da empresa francesa, Alsthom.

Enquanto se investiga e corrige a corrupção a nivel nacional, temos os nossos escândalos fluminenses.

No Rio, os governadores e os prefeitos costumam governar com pouca interferência do legislativo ou do judiciário. O sistema de nomeações de secretários,juizes e conselheiros os sustenta e protege.

Apesar de investigações e reportagens, funciona assim há muito tempo.

O ex governador Sérgio Cabral (2007-2014), por exemplo, figura desde 2011 em suspeitas e acusações de comportamento ilícito. O nome dele surgiu em depoimentos de delação premiada, da Lava Jato. Se as informações forem provadas, ele pode ser preso e julgado. Por enquanto, ele vive e trabalha, sem alarde, no Leblon, de acordo com uma matéria recente.

O sucessor dele, Luiz Fernando “Pezão” de Souza, também estaria envolvido no caso, de acordo com um delator. Afastado do cargo, o Pezão está em tratamento para câncer linfático.

Possivelmente, nem o governador interino, Francisco Dornelles, de 80 anos, se salve da Lava Jato.

Semana passada, Dornelles baixou um decreto que pode absolver quem evadiu o pagamento de ICMS antes de 2014. Depois, ele explicou que o empobrecido estado do Rio não pretende abrir mão dos recursos devidos de sonegadores repetentes.

Em maio deste ano, o jornal O Globo publicou uma série de matérias investigativas sobre Jorge Picciani, presidente da assembleia legislativa do estado, a Alerj. De acordo com o jornal, ele estaria envolvido em uma esquema de evasão de ICMS, junto com inspetores da Secretaria estadual de Fazenda do Rio e o Grupo Petrópolis, fabricante da cerveja Itaipava. O esquema inclui a compra e venda de matrizes de gado a preços exorbitantes — e fora do padrão do mercado, de acordo com uma fonte do blog em São Paulo.

Picciani também participa, de forma inusitada, de uma empresa que fornece brita para obras públicas, inclusive das Olimpíadas.

Nos anos de boom econômico, o estado do Rio presenteava empresas com isenções fiscais que hoje viraram uma grande dor de cabeça.

Enquanto, no âmbito estadual, a lama começa a chegar à superfície, o prefeito Eduardo Paes se vangloria de sua lisura. Semana passada, porém, o Tribunal de Contas Municipal, que até então cooperava com sua gestão, pediu a rejeição da contabilidade dos gastos e receitas do município — mas isso pode ter motivação política.

Em março deste ano, soubemos que Paes seria dono do codinome “nervosinho” numa planilha de pagamentos de propina da construtora Odebrecht.

Some good things we never had before

Não foi bem assim

Fora isso, não temos informações concretas, públicas, sobre Paes e qualquer atividade ilícita. Os contratos de construção relacionados à Olimpíada estariam sendo investigados. Da mesma forma que conseguiu barrar uma CPI dos ônibus, em 2013, Paes enfraqueceu a CPI das Olimpíadas, na Câmara dos Vereadores.

No fim das contas e dos julgamentos, do jeito que anda a Lava Jato (para se informar sobre a história dela até maio deste ano, leia o recém-lançado livro de Vladimir Netto), o Rio seguramente verá políticos seus na cadeia.

Teremos portanto, um grave vácuo de poder. Contudo, o problema financeiro-econômico do Rio é mais gritante.

Tomara que os corruptos presos sejam levados para outro estado; um relatório entregue semana passada ao governador interino Francisco Dornelles, revela que grande parte dos crimes aqui são administrados justamente por quem está atrás de grades fluminenses.

Sexta-feira, um juiz soltou cinco presos que estavam no presídio Bangu 8, acusados de lavagem do dinheiro de propinas de construtoras na investigação Lava Jato. A ordem para soltá-los veio depois que o estado constatou que não pode cumprir outra ordem relacionada aos cinco, de prisão domiciliar. As tornozeleiras eletrônicas, necessárias para que fossem enviados para casa, estavam em falta.

O governo estadual deve quase R$ 3 milhões à fornecedora dos apetrechos.

About Rio real

American journalist, writer, editor who's lived in Rio de Janeiro for 20 years.
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