Intervenção federal poderia criar brecha para a implementação de políticas públicas efetivas, mas não deve acontecer
No cálculo de tudo que sabemos sobre o novo papel dominante do Comando do Leste na segurança pública do Rio de Janeiro — divulgado quinta-feira, tarde de noite– há uma certeza. O planejamento acabou de começar.
Não é um bom sinal. Planejamento é uma das áreas fracas da estrutura existente de segurança pública, junto com trabalho em equipe. A pesquisa que sua blogueira fez sobre o assunto nos últimos quatro meses revelou que o Rio é um arquipélago de grupos de interesse, a maioria em competição por recursos cada vez mais escassos, sejam de governo, do setor privado ou produzidos pelo crime. É fenômeno raro, juntar as mãos para servir à sociedade como um todo.
Talvez os militares consigam conter a atividade criminosa no Rio metropolitano, por um tempo (estarão entre nós pelo menos até o fim do ano). Contudo, precisa-se de muito mais do que botas e capacetes, para sentirmos e termos mais segurança. Segue o que algums especialistas têm como propostas:
- Reforma policial— capacitação, letalidade, corrupção, carreiras, integracão entre as Polícias Civil e Militar, demilitarização, gestão, condições de trabalho, sistemas de informática e dados e a utilização destes
- Maior coordenação policial com o judiciário, para que criminosos não voltem às ruas com tanta rapidez
- Reforma prisional — condições mais humanas, repressão de facções e privilégios, redução de população (sentenças mais breves para crimes menos graves)
- Maior controle de armas — papel maior para a Polícia Federal, criação de guarda costeira, sistema de licenciamento de armas como o que existe para veículos
- Criação de um Ministério de Segurança Pública, com um papel central para o governo federal na concepção e indução de políticas públicas estaduais (de acordo com a imprensa, Temer talvez faça isso em breve)
- Legalização de drogas, com Portugal como modelo, focando em saúde pública
- Prevenção do crime entre jovens, em escolas e comunidades como um todo
A reforma policial por si só envolve obstáculos (inclusive a necessidade de uma emenda constitucional) e interesses corporativos; imagine tentar fazer pelo menos uma parte do resto, além disso. Onde estão os recursos?
Crimes militares não se julgam no sistema dos cidadãos comuns, prevalecendo, ao contrário, a corte militar. Isso já causou problemas no Rio, no caso recente de uma operação conjunta militar/Polícia Civil, em São Gonçalo, com mortes até hoje guardadas em mistério.
Temos uma situação de extrema complexidade — num ano eleitoral com mais fatores desconhecidos do que o Brasil já experimentou em toda sua história. Quando consideramos os três anos durante os quais o Rio já conviveu com dificuldades financeiras, administrativas, políticas e de crime, é difícil adivinhar qual foi o elemento que levou, enfim, o presidente Miguel Temer a tomar essa decisão histórica, e a promessa de melhorias que a intervenção federal nos traria.
Pode ser que cheguemos a lamentar a noite em que gargalhamos coletivamente, enquanto passou pela avenida Sapucaí a alegoria da escola de samba, Paraiso de Tuiuti, Temer de vampiro .
Ótimo post e análise Julia!Bjs Maria Cristina (Tite) de Lamare do Rego Barros
Obrigada, Tite! Você é uma ótima leitora!