
Discursou um dos advogados do jovem morador do morro dos Prazeres, Willian Preciano, preso há dois meses. Vizinhos e familiares dizem policiais erraram na identificação
Quem mora ou tem amigos que moram em favelas do Rio de Janeiro sabe que esses sofrem violência cometida por traficantes de drogas, milicianos e policiais. Hoje, diante da perspectiva de comportamento linha-dura por parte de agentes formais e informais de segurança — mesmo que essa posição tenha apoio eleitoral expressiva em muitas favelas — já surgem preocupações sobre a mudança de ambiente nas cidades brasileiras.
Brian Winter, editor da revista norte americana Americas Quarterly, que acompanha as ideias e declarações de Jair Bolsonaro (inclusive em entrevistas exclusivas) há alguns anos, prevê num artigo recente “uma ofensiva mortífera nos próximos meses”. É essa a prioridade máxima do candidato do PSL, aponta, ou seja, “relaxar leis e normas para as forças de segurança, permitindo que atirem primeiro e façam perguntas depois (em níveis mais altos do que hoje, considerando que policiais já matam cinco mil pessoas por ano). O objetivo é intimidar ou matar traficantes de drogas, ladrões e outros criminosos – e assim reverter o crescimento inexorável do crime desde a volta da democracia ao Brasil, em 1985”.
A sociedade brasileira, diz Winter, está afim de pound some heads, ou bater em algumas cabeças, apesar de a maioria de especialistas em segurança pública advertir que tal abordagem é fadada ao fracasso, pois “a sociedade brasileira mudou desde os anos 1980 e já fracassou a militarização da segurança em lugares como o México e a América Central, além do próprio Rio de Janeiro, desde fevereiro deste ano”.
Em vez de “bater cabeças”, dizem especialistas, diminuir a criminalidade depende de medidas sofisticadas, como capacitar, equipar, remunerar, controlar e administrar melhor as polícias; utilizar inteligência e informação de forma efetiva; integrar o judiciário e as penitenciárias como atores em políticas de segurança pública e aumentar o papel federal no controle e sustento desta questão chave da vida nacional.
Um presidente que liderasse tal abordagem estaria, como pretende o Bolsonaro, atendendo ao anseio forte da sociedade brasileira de poder viver e transitar em paz no país.
Com uma política de segurança pública menos sofisticada, afirma Winter, será alto o preço humano. Inocentes irão morrer e serão sujeitos à tortura. Milicianos, diz, irão se aproveitar do ambiente para ajustar contas e intimidar inimigos. Teremos mais casos como o assassinato da Marielle.
Não-eleitores do PSL de Jair Bolsonaro, mulheres, jornalistas, não-brancos e não-heterossexuais já relatam ataques violentos em escala maior do que antes do primeiro turno. Jair Bolsonaro, ele mesmo vítima, diz não poder controlar seus seguidores. O site Mapa da Violência está recebendo e publicando os relatos.
Mesmo antes do surgimento da onda Bolsonaro, os direitos humanos, protegidos pela Constituição, sofriam investidas no Rio de Janeiro. Ontem à noite, moradores da favela do morro dos Prazeres fizeram um protesto para defender o jovem William Preciliano, que dizem ter sido preso indevidamente, há dois meses. Prisões errôneas já aconteceram duas vezes antes no morro.
Durante o protesto, sua blogueira perguntou a defensores de direitos humanos presentes sobre estratégias para o que promete ser uma nova era PSL. Alguns, no aguardo do resultado do segundo turno das eleições, duvidam que o Rio de fato seja governado a base da ideologia do partido do Bolsonaro. Outros confiam no poder continuado da denúncia.
Claro que as instituições governamentais e as organizações de terceiro setor que trabalham nessa área não irão desistir de defender os membros mais fracos da sociedade. Mesmo que o PSL domine, a partir de 2019, a assembleia legislativa estadual, tivemos a eleição de cinco mulheres negras ao parlamento, que devem lutar, junto com alguns colegas, pelos direitos daqueles que podem sofrer os efeitos colaterais da esperada política de segurança pública linha-dura. A imprensa, que começou a cobrir de maneira mais completa os territórios urbanos informais a partir de 2008, com a pacificação, também terá um papel importante nos embates e debates que nos aguardam.
Muito boa exposição da conjuntura atual brasileira, Julie!
Assim que passar a eleição, as raivas e tristezas, teremos que reorganizar o pensamento e a prática progressista para reconquistar pessoas que perdemos também por inabilidade política.