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Carnaval 2011
A provável descoberta das ruínas centenárias do Cais do Valongo na véspera do carnaval desse ano pode ter trazido à tona, como aponta o articulista e historiador Elio Gaspari em sua coluna de quarta-feira de cinzas no jornal O Globo, o maior porto de escravos no mundo. Que momento mais perfeito.
As ruínas apareceram bem no fim de fevereiro, durante as escavações de revitalização urbana do projeto Porto Maravilha — resultado do milagroso alinhamento, praticamente astrológico, entre os governos municipal, estadual e federal, que começou em 2009. Desse alinhamento surgiu uma série de políticas públicas que iniciaram uma inédita integração dos morros com o asfalto da cidade. Gaspari comenta que apesar de pelo menos 600 mil escravos terem passado pelas pedras do Cais do Valongo entre 1758 e 1851, a área estava enterrada e esquecida, devido “à astuta amnésia que expulsa o negro da História do Brasil”.
O ressurgimento do Cais do Valongo foi uma bela coincidência, na hora em que o Rio de Janeiro comemorava o carnaval com mais verve e plenitude do que a maioria dos cariocas tem memória. Até o irascível Arnaldo Jabor ficou impressionado. “Aos poucos, o país retomou sua autoestima e, especialmente no Rio, ela cresce nos últimos tempos, com o melhor controle da criminalidade e com o fim dos governos sórdidos que jogaram a cidade no buraco,” ele afirmou na sua coluna de terça-feira em O Globo. “[…] sente-se o renascimento de um desejo gregário, até de contato físico entre as pessoas, uma explosão de liberdade e de encontro que nos leva a concluir que houve uma democratização da convivência, um irresistível desejo de existir em comunidade.”
Já faz uns cinco anos que o carnaval de rua ganha adeptos. Mas neste ano um bloco atraiu 2 milhões de foliões ao centro da cidade no sábado de manhã, e outro subiu o morro até a favela do Cantagalo, agora pacificada, pela primeira vez em 27 anos. Três casais contraíram o matrimônio durante as festividades dos blocos—e três das 12 escolas de samba do Grupo Especial gozam de UPPs, enquanto outro território de escola de samba, o Complexo do Alemão, já está ocupado pelo Exército e deve receber uma UPP.
De acordo com O Globo, a polícia militar diminuiu sua presença no estado por mil soldados, porque as favelas em volta ao Sambódromo já têm UPPs. A polícia também contou com o novo Centro de Comando Virtual, que trabalha na prevenção do crime ao ligar as forças policiais em todos os níveis de governo, e utiliza tecnologia da FBI norte-americana; com uma presença veicular incrementada; e com o monitoramento dos festejos através de trinta câmeras novas.
Existem tantos blocos—em torno de quatrocentos— que alguns irão se reunir apenas no fim de semana que vem. Neste ano, a prefeitura regulamentou os blocos e seus horários, colocou mais guardas municipais na rua, instalou mais banheiros portáteis do que nunca, e a polícia até prendeu quase setecentas pessoas (mais do que o dobro do ano passado), inclusive mulheres, por urinar em público. Rebocaram-se por volta de setecentos carros, também mais do que o dobro do ano passado. Infelizmente, a coleta de lixo aumentou para 849 toneladas, mais 12% em comparação com 2010. Uma empresa de cerveja pendurou centenas de placas bem-humoradas, instando o alívio off-road. Mesmo assim, o mau cheiro estava em toda parte, bares e restaurantes tiveram que trancar suas portas, e alguns cariocas sugeriram que talvez tenha chegado a hora de concentrar os blocos em um único local, possivelmente o Aterro, para manter a cidade limpa e sem congestionamentos.
Em função da redução da criminalidade e do maior conhecimento internacional da cidade do Rio devido aos vindouros eventos esportivos, estima-se que o carnaval de 2011 tenha trazido à metrópole um milhão de visitantes, muitos deles brasileiros de outras regiões. Quatorze cruzeiros atracaram aqui para a diversão, e espera-se que um total de cerca de um bilhão de reais tenha entrado na economia carioca.
Os desfiles no Sambódromo fizeram muitas referências felizes à cidade maravilhosa, como por exemplo uma ala inteira de Zé Cariocas (foto #9). Talvez a mais marcante tenha sido a bateria do Salgueiro, fantasiada de soldados do BOPE, à laTropa de Elite. A glorificação do BOPE pode ser um tanto exagerada, já que aquelas tropas ainda são, em grande parte, um conjunto bastante violento e corrupto – especialmente quando contrastado com os novos recrutas das UPPs. Acabou-se de implantar uma UPP no Salgueiro; a bateria recebeu instrução para devolver as fantasias logo que possível, para não criar confusão.
Na terça-feira, o governador Sérgio Cabral disse, de maneira bastante humilde, que esse carnaval foi o melhor desde que ele assumiu o cargo em 2007, e que ainda há muito trabalho pela frente. O governo dele avança sem trégua, mesmo durante o carnaval, com a criação de duas novas subsecretarias, uma para reduzir as emissões de carbono no estado e outra para promover o turismo de eventos e esportes.
Hoje, os garis da Comlurb estão dando duro. Só no Sambódromo juntaram mais de quatrocentas toneladas de lixo. E o Rio de Janeiro precisa estar cintilando para a visita do presidente dos EUA Barack Obama, dia 20 de março.
Aqui estão os planos da prefeitura para quem quiser conhecer o Cais doValongo, que ainda precisam de aprovação do governo federal.