Violência em Copacabana: para onde vai nos levar?

Pavão-Pavãozinho in more peaceful times, with investment in new construction after pacification

Pavão-Pavãozinho em tempos de paz maior, com investimento em construção nova, pós pacificação

For Violence in Copacabana: where will take it us?, click here.

Cada novo evento trágico no Rio demonstra as fraquezas da democracia brasileira:

  • um sistema judiciário que deixa, frequentemente, de servir a todos os cidadãos de maneira justa e de valorizar o bem maior
  • enorme desconfiança da mídia, da polícia, o sistema judiciário, os políticos e outras instituições
  • péssimos níveis de instrução
  • políticas públicas que são vistas como propriedade não do estado, mas de uma determinada administração governamental
  • vácuos de poder (no Rio, criados pelo rebaixamento de traficantes de droga cujos territórios são pacificados), prontamente ocupados pela polícia, sem treinamento nem reflexão pública suficiente.

Uma juiza deixou que o traficante de drogas da favela Pavão-Pavãozinho, Adauto do Nascimento Gonçalves, o Pitbull, fizesse uma visita à família, da qual ele nunca voltou. Pertubou-se, assim, a tênue paz na favela pacificada, parte da qual, de nome apropriado “Vietnã”, há alguns meses saiu do controle policial. Essa mudança aconteceu no contexto de eventos parecidos pela cidade toda: ataques a policiais e mais violência sendo experimentada por moradores em outras favelas.

Ao mesmo tempo, o enfraquecido governador Sérgio Cabral acaba de deixar o cargo para que o seu vice, Luiz Fernando de Souza, o Pezão, pudesse fazer nome entre os eleitores que irão votar para um novo governador neste outubro.  A política de segurança pública do Rio de Janeiro depende do resultado da eleição.

Nos últimos meses, moradores de favela têm se manifestado com frequência, muitas vezes, em resposta à violência policial. O jornal O Globo relata que traficantes de drogas estariam, em alguns casos, por trás das manifestações. Outros fatores, como os exemplos das manifestações de rua de junho-julho-agosto de 2013, a greve dos professores, e a dos garis, também podem contribuir a uma nova disposição para “descer o morro”, bloquear ruas, e incendiar lixo, ônibus e outros itens.

Desde o ano passado, critica-se sempre mais o comportamento policial, sobretudo após a morte do pedreiro Amarildo, que teria morrido durante uma sessão de tortura policial. O sociólogo Ignacio Cano, que em 2012 elaborou uma avaliação do programa de pacificação policial, acredita que foram instituídas poucas das recomendações dele, inclusive a instituição de protocolos para o comportamento policial.

Então, ontem de manhã em Copacabana, surgiu a tragédia mais recente, parte do que promete ser, por um bom tempo, uma sequencia de notícias de horror. Descobriu-se o corpo de Douglas Rafael da Silva Pereira, o DG, numa crêche do morro de Pavão-Pavãozinho. Houve depois pelo menos mais uma morte; de noite, ouviu-se tiros e estrondos; a base da UPP sofreu um ataque e faltou luz em grande parte da favela. Douglas morreu, de acordo com um relatório preliminar do IML, de um objeto transfixante ao pulmão. De acordo com um perito, o objeto foi uma bala.

Hoje, a luz voltou e acabou-se o barulho.

De acordo com a Globo TV, houve tiroteios intensos na segunda-feira de noite, enquanto a polícia tentava cercar o “Pitbull”. Já corre uma investigação dessa ação policial. Pode ser que Douglas, que, por coincidência, como outro jovem que morreu de maneira violento há dois anos, dançava no programa dominical pioneiro de Regina Casé, Esquenta!, levou um tiro no meio da batalha.

De acordo com a mãe dele, Douglas foi torturado pela polícia e existe uma testemunha do fato. Apesar de não morar na favela (porém perto), ele protagonizou uma curta metragem que parece ter prenunciado a morte.

Neste cenário complexo, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos aumentam a pressão em todos.

E a pacificação, no centro da virada do Rio de Janeiro e do debate sobre o aumento da violência aqui? E o assunto que irá, provavelmente, decidir a eleição?

As fraquezas delineadas acima são apenas parte de uma complexa estrutura social e de poder, que precisa passar por mudanças radicais, das quais depende a sobrevivência da democracia brasileira. Seria impossível desemaranhar essa estrutura numa única levada revolucionária. Para o Rio, a pacificação, com seus muitos defeitos, foi um primeiro passo na direção certa, assistido pelo aumento real da renda, o crescimento econômico e maior acesso à faculdade, entre outras melhorias.

Mas a política de segurança pública, iniciada em 2008, chacoalhou todos os jogadores da estrutura social do Rio, e iluminou as verrugas deles. Agora que todos nós (e centenas de jornalistas estrangeiros que estão cobrindo os mega eventos) conseguem vê-los com mais clareza, o que faremos com eles? Com qual rapidez ou lerdeza podemos continuar a desemaranhar — e redesenhar — a antiquada estrutura socioeconômica do Brasil?

Aguardemos o ano de 2015.

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About Rio real

American journalist, writer, editor who's lived in Rio de Janeiro for 20 years.
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3 Responses to Violência em Copacabana: para onde vai nos levar?

  1. Neusa says:

    Me pergunto, quem sera essa juiza boazinha, coitada, devia estar com pena do pobre rapaz que so queria visitar a familia.

  2. Elizabeth Leeds says:

    Boas e pertinentes perguntas, Julia

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