
Arte pública no recém inaugurado hotel, 55 Rio, na Lapa: parte de um retrofit revolucinário no centro da cidade
Não, sim e talvez
É cedo demais para dizer, é claro. Partes do legado olímpico, a mobilidade, nem estão prontas ou operando plenamente. Portanto, meu talvez.
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Sua blogueira tem ouvido bastante a pergunta do título deste post e, apesar de ter lidado bastante com o assunto (fique à vontade para dar uma pesquisada, utilizando palavras-chave), a hora é boa para um resumo rápido.
Os Jogos Olímpicos coroam uma série de mega eventos aqui sediados desde 2012, com a intenção de colocar o Rio de Janeiro no mapa global. Os eventos mexeram com uma passividade antiga, a sensação de que não dava para melhorar a metrópole, assolada pela pobreza, a violência e a política tradicional — de territórios, favores e centros sociais. Aumentou a expectativa. Aqui reside meu sim.
Já escrevi que esse “branding“, objetivo dos mega eventos, não era necessário para nossa extraordinária metrópole. Teria sido mais útil olhar para dentro, diretamente aos nossos problemas, em vez de olhar para fora, para o nosso relacionamento com o resto do mundo.
O legado da mobilidade esquivou da desigualdade, semente de todos os problemas do Rio. Sim, há melhorias, as viagens são mais curtas. O legado, porém, centrou-se na Zona Oeste, onde fica o Parque Olímpico, contribuindo ao custoso espraiamento urbano, favorecendo empreiteiras e empreendimentos imobiliários direcionados às classes mais altas. Deixou a Zona Norte bastante carente de mobilidade, enquanto moradores da Zona Oeste ainda precisam atravessar grandes distâncias para chegar no trabalho.
Também permitiu que a cidade relegasse ao segundo plano a promessa de urbanizar todas as favelas até 2025 — o que, mesmo que a promessa tivesse sido até hoje parcialmente cumprida, teria sido uma façanha. A prefeitura também deixou de incluir a moradia no plano do Porto Maravilha, que teria encurtado muitas viagens trabalho-casa e contribuído à vitalidade da região.
A desigualdade criou e perpetua um sistema duplo aqui, pelo qual os brasileiros de renda maior dirigem carros, contam com planos de saúde, colocam os filhos em colégios particulares e empregam seguranças particulares — enquanto os brasileiros de renda menor utilizam transporte público, dependem do sistema público de saúde e escolar e arriscam a vida no meio dos tiroteios entre policiais e traficantes (por exemplo), atracados na Guerra às Drogas, uma guerra sem saída.
O sistema é tão enraizado que quem é daqui tem dificuldade em percebê-lo. O prefeito Eduardo Paes já falou, despreocupadamente, que tem a sorte de não ter que enviar os filhos para uma escola pública. Veja a localização da estação de BRT perto da Vila Olímpica, que deve se tornar um valorizado empreendimento imobiliário após os Jogos: é para as empregadas domésticas, seguranças e outros funcionários. Os moradores terão seus carros na garagem.
Não é exclusivamente um problema brasileiro, a desigualde– e é tão delicada e perigosa aqui como na Venezuela, o Reino Unido ou os Estados Unidos. Trata-se do contexto no qual os Jogos Olímpicos se inserem, e explica o motivo pelo qual parte de minha resposta é não. Tente só realizar uma transformação urbana, gerada por mega evento, no meio de uma democracia enviesada. Vai acabar por remover moradores de favela para “limpar” a vizinhança — sendo que, ironicamente, o charme do Rio vem justamente de nossa mistura de classes, raças e culturas.